Direitos de Mães de crianças com Espectro Autista no Mercado de Trabalho

O Autismo, também conhecido como Transtorno do Espectro Autista (TEA), é uma condição neurobiológica que afeta a maneira como uma pessoa percebe o mundo e interage com os outros.

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É chamado de “espectro” porque engloba uma ampla gama de características e níveis de gravidade, variando de indivíduo para indivíduo. Alguns podem ter dificuldades significativas na comunicação e no comportamento, enquanto outros podem levar vidas independentes e funcionais.

Legislação

No Brasil, há leis e políticas que visam proteger os direitos das pessoas com autismo e promover sua inclusão e acessibilidade. Aqui estão algumas das principais legislações e diretrizes relacionadas à proteção das pessoas com autismo:

Lei Berenice Piana (Lei nº 12.764/2012): Esta lei institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Ela estabelece diretrizes para o atendimento integral às pessoas com autismo, incluindo ações de saúde, educação, assistência social e garantia de seus direitos.

Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015): Este estatuto reconhece o autismo como uma deficiência e estabelece direitos e garantias às pessoas com autismo, incluindo acesso à educação, saúde, trabalho, transporte, cultura e lazer.

Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva: Esta política, regulamentada pela Resolução nº 4/2009 do Conselho Nacional de Educação, estabelece diretrizes para a inclusão de alunos com deficiência, incluindo autismo, nas escolas regulares. Ela prevê a oferta de recursos e apoios necessários para garantir o acesso, a permanência e o sucesso escolar desses alunos.

Lei Federal n.º 13.977/2020 – denominada “Lei Romeo Mion”:  Institui a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea).

Além dessas legislações, é importante mencionar que os Autistas que possuem renda familiar de até dois salários mínimos, é assegurada a gratuidade no transporte interestadual, cuja solicitação é realizada no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) mais próximo de sua residência. 

Em alguns casos, a pessoa com transtorno do espectro autista pode receber Benefício da Prestação Continuada, desde que a renda mensal per capita da família seja inferior a 1/4 do salário mínimo. Sendo necessário fazer a inscrição no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) e o agendamento da perícia no site do INSS.

Mães Atípicas e o Mercado de Trabalho

No contexto do ambiente de trabalho, as mães autistas possuem direitos trabalhistas semelhantes aos de outros trabalhadores, mas podem enfrentar desafios específicos relacionados à sua condição. Aqui estão alguns pontos importantes a serem considerados:

  • Direito à não discriminação: Mães de autistas têm o direito legal de não serem discriminadas no local de trabalho com base em sua condição de autismo. Isso inclui proteção contra discriminação na contratação, promoção, treinamento e outras áreas relacionadas ao emprego.
  • Acesso a acomodações razoáveis: Dependendo das necessidades específicas relacionadas ao autismo, as mães de autistas podem ter direito a acomodações razoáveis no local de trabalho. Isso pode incluir ajustes no ambiente de trabalho, na carga horária, nas tarefas ou nas interações sociais, para ajudar a garantir um ambiente de trabalho inclusivo e acessível.
  • Licenças médicas e flexibilidade no trabalho: Se uma mãe de autista precisar de tempo fora do trabalho para gerenciar sua saúde ou para cuidar de seus filhos, ela pode ter direito a licenças médicas ou outras formas de flexibilidade no trabalho, conforme previsto pela legislação local.
  • Proteção contra assédio e ambiente de trabalho hostil: Mães de autistas têm o direito de trabalhar em um ambiente seguro e livre de assédio. Se enfrentarem discriminação, assédio ou um ambiente de trabalho hostil devido ao autismo, elas têm o direito de denunciar tais comportamentos e buscar medidas corretivas.
  • Conscientização e educação no local de trabalho: As empresas podem promover a conscientização e a compreensão sobre o autismo no local de trabalho, fornecendo treinamento e educação sobre as necessidades e desafios específicos enfrentados pelas pessoas autistas, incluindo as mães de autistas.
  • Acesso a programas de apoio e recursos: Mães de autistas podem se beneficiar de programas de apoio e recursos disponíveis em suas comunidades, como grupos de apoio, serviços de aconselhamento e organizações que oferecem suporte específico para pessoas autistas e suas famílias.

É importante que as mães de autistas estejam cientes de seus direitos e recursos disponíveis para elas no local de trabalho e na comunidade. Se enfrentarem desafios ou problemas relacionados ao emprego, elas devem procurar orientação e apoio de profissionais especializados em direitos trabalhistas e defesa dos direitos das pessoas com deficiência.

Uma criança autista demanda de muitos cuidados para a realização de tratamentos médicos, fisioterápicos e psicológicos, o que, consequentemente, obriga a mãe atípica a se ausentar com frequência de suas atividades laborais. 

As mães atípicas, funcionárias públicas civis, estaduais e municipais, já têm assegurado por lei a redução da jornada de trabalho, previsto no artigo 98, da Lei 8112/1990. Já para as mães que trabalham contratadas pela CLT,  ainda não há uma legislação específica sobre essa matéria. Entretanto, os Tribunais Regionais do Trabalho têm decidido pela redução da jornada de trabalho sem a redução da remuneração ou compensação de jornada. 

Destacamos a importante decisão proferida nos autos do processo trabalhista  de nº 0000063-21.2023.5.14.0061, que tramitou na comarca de São Miguel do Guaporé/RO, onde determinou o retorno da mãe de uma criança diagnosticada com transtorno do espectro autista (TEA), ao quadro de funcionários de sua ex-empregadora em condições especiais de trabalho, laborando na modalidade home office, sem prejuízo salarial. 

A decisão possui o fito de possibilitar que a mãe atípica acompanhe diariamente o seu filho nas atividades necessárias, inerentes ao seu desenvolvimento. 

A decisão se amparou no Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conforme a Resolução 492, a Convenção n. 156 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que, entre outras coisas, trata da igualdade de oportunidades para trabalhadores com responsabilidades familiares, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146 /2015) e a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Lei n. 12.764/2012).

Conclusão

Mães atípicas enfrentam desafios únicos e muitas vezes complexos no ambiente de trabalho devido às demandas adicionais relacionadas ao cuidado de seus filhos com necessidades especiais. Essas mães precisam lidar não apenas com as pressões e expectativas do trabalho, mas também com a necessidade de oferecer suporte e cuidado extra a seus filhos.

No entanto, é importante reconhecer que mães atípicas também trazem consigo uma incrível resiliência, determinação e habilidades de gerenciamento de tempo que podem ser valorizadas no local de trabalho. Empregadores que demonstram compreensão, flexibilidade e apoio podem criar um ambiente de trabalho mais inclusivo e acolhedor para essas mães, permitindo-lhes alcançar um equilíbrio saudável entre suas responsabilidades familiares e profissionais.

Além disso, como forma de melhor atender às necessidades da criança autista, ante a suas peculiaridades, a própria Justiça do Trabalho tem decidido sobre a redução da jornada de trabalho de mães atípicas sem redução salarial e compensação da jornada, viabilizando a continuidade dessas mães no mercado de trabalho.  Para solicitar esse direito, é necessário apresentar a documentação necessária e comprovar a necessidade de sua presença para o cuidado da criança. 

Em última análise apoiar mães atípicas no local de trabalho não apenas promove a justiça social e a equidade, mas também contribui para o bem-estar geral das famílias, o sucesso das organizações e o progresso da sociedade como um todo.

Fonte: Dra. Patrícia Gonçalves Alves, advogada na Montañés Albuquerque Advogados – A Montañés Albuquerque Advogados foi criada a partir da necessidade de suprir a crescente demanda de clientes que conheciam a competência, integridade e eficiência das sócias e colaboradores da Cone Sul Marcas e Patentes, criada em 1995. Com a divisão do corpo jurídico das empresas, houve a possibilidade da Montañés Albuquerque Advogados também atuar em outras áreas, como cível, família, trabalhista e empresarial

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