O Lado B da Maternidade: como Fica e Quem Cuida da Saúde Mental da Mãe?

“A maternidade é uma das experiências mais transformadoras na vida de uma mulher”. Essa frase é repetida exaustivamente, quase sempre com uma conotação positiva sobre o ser mãe.

imagem pixabay

“A maternidade é uma das experiências mais transformadoras na vida de uma mulher”. Essa frase é repetida exaustivamente, quase sempre com uma conotação positiva sobre o ser mãe. De fato o é, mas é preciso também falar sobre o ônus da maternidade: a sobrecarga da mulher. Um estudo conduzido pela Universidade de São Paulo (USP) trouxe em números uma realidade: 97% das mães se sentem sobrecarregadas todos os dias e 94% dizem estar desgastadas. Os dados são alarmantes e abrem espaço para uma discussão ainda pouco colocada em pauta: como fica e quem cuida da saúde mental das mães, que na mesma pesquisa classificaram sua saúde mental como “péssima”?  

Dra Karen Scavacini, psicóloga e fundadora do Instituto Vita Alere, fala sobre o assunto: “A pesquisa conduzida pela USP trouxe um fato que já era sabido. Quase 100% das mães se sentem negligenciadas. No mesmo estudo foi mostrado que pouco menos de 50% dessas mães buscam ajuda profissional e as objeções têm algo em comum: essas mães pouco tempo têm para olharem para si. Elas estão sempre se doando para os outros e deixando de lado a si mesmas”. O resultado dessa equação desequilibrada de autocuidado é um aumento expressivo no desenvolvimento de diagnósticos psiquiátricos – depressão e ansiedade são os mais relatados e, em casos severos, suicídio. “A mulher tem uma jornada mais extensa que a do homem. Ela trabalha, cuida da casa e ainda, em muitos lares, é quase totalmente responsável pela educação dos filhos. Tantas obrigações fazem com que realmente deixem de dar atenção a si mesmas, sempre numa busca desenfreada de ter que dar conta de todas as suas tarefas. Enquanto isso, o pai, em muitos casos, assume um papel de coadjuvante nesse contexto. Ao cenário junta-se também o desgaste natural do puerpério – uma questão por vezes genética, por vezes do próprio ambiente que cerca essa nova mãe e, sempre, um tema ainda tabu. A sociedade precisa naturalizar conversas sobre o puerpérios difíceis e, mais do que tudo, criar ações concretas que mudem todo esse cenário ”, diz Karen.

Uma das soluções é exatamente essa: a divisão de tarefas. É preciso alterar a dinâmica familiar e colocar o homem como um protagonista nas tarefas da casa e na criação dos filhos, tanto quanto a mãe. “Biologicamente já somos 50% pai e 50% mãe e é preciso levar a Biologia para além da divisão genética. A paternidade precisa de espaço de protagonista tanto quanto a maternidade. Sei que isso pode ser utópico para muitas famílias pois é um comportamento enraizado, mas a mudança precisa começar a ser promovida aos poucos”, sugere a doutora.

Outra grande mudança vem de uma atitude simples, mas que muitas mães afirmam não conseguirem fazer: autocuidado. “Ler um livro, assistir a um filme ou seriado e até mesmo tomar um café sossegada” são alguns dos conceitos de autocuidado que as mães gostariam de ter, sem sucesso. De novo, é preciso mudar um comportamento enraizado e aqui até mesmo essas mães precisam mudar o padrão de comportamento. “Uma mãe que escolhe ler um livro ao fim de um dia cansativo no lugar de, por exemplo, organizar a louça da pia, se sente culpada por essa escolha. É preciso mudar o pensamento dessa mãe que, com certeza, merece ter seu tempo de acolhimento.  A mudança desse hábito pode ser incorporada aos poucos para que, devagar, a culpa dê lugar a um sentimento de recompensa e nesses casos a divisão de taradas tem um papel fundamental para que a mãe tenha esse seu espaço”, ensina a fundadora do Vita Alere.

Mudanças no mundo corporativo também precisam ser mencionadas. “Muitas mães se sobrecarregam por terem medo – infelizmente muitas vezes real – de perderem seus empregos por conta da maternidade. As empresas precisam investir na capacitação de líderes e gestores para acolherem as colaboradoras que são mães. É preciso que cada vez mais as corporações tenham políticas de melhoria para essas colaboradoras. Uma mãe segura de que pode faltar um dia em seu trabalho porque precisa acolher um filho doente é, certamente, uma funcionária que produz melhor”, diz Karen. Maio Furta-Cor está chegando e com ele iniciativas devem ser reais e não posts em redes sociais. A saúde mental das mães precisa de atenção e não somente no mês em que se coloca o assunto em voga. Comecemos a mudança hoje. Agora.

Fonte: Dra Karen Scavacini é idealizadora, cofundadora, coordenadora e responsável técnica do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio. Formada em psicologia, Karen é doutora em “Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano” pela USP e  mestre em “Saúde Pública na área de Promoção de Saúde Mental e Prevenção ao Suicídio” pelo Karolinska Institutet, localizado na Suécia. 

Deixe um comentário