Médica com pós-graduação em Pediatria e Estudos do Sono, Dra. Ana Jannuzzi, alerta sobre uso da suplementação nos pequenos
Em gotas, gominhas ou até em comprimidos. São inúmeras as formas de suplementar melatonina hoje em dia, seja para melhorar o sono ou até mesmo combater uma insônia causada pelo estresse. Mas, e se essa dose extra do hormônio responsável por regular o sono for ingerida acidentalmente por uma criança?
Segundo um estudo realizado pelo Hospital Infantil de Michigan (EUA), e divulgada neste mês de junho, houve um aumento de 530% na ingestão excessiva acidental de melatonina por crianças, nos últimos 10 anos. Os pesquisadores acreditam que os dados são consequência do aumento dos níveis de estresses dos americanos, o que teria facilitado o acesso de crianças a melatonina. Cerca de 94% dos casos foram com crianças que não usavam o medicamento, mas que conviviam com familiares que usavam.
Não à toa, outro dado que corrobora essa “geração insônia” e a facilidade de se encontrar a suplementação nas casas, é uma pesquisa divulgada no periódico científico JAMA Network, com base em informações de um banco de dados nacional, sobre saúde e nutrição. O levantamento mostra que 93,9% dos americanos consultados na pesquisa usavam melatonina por conta própria. Para a médica com pós-graduação em pediatria, Dra. Ana Jannuzzi, os pais devem estar em alerta, caso tenham a suplementação em casa. E que, na maior parte dos casos, não há necessidade do uso em crianças.
“Nos Estados Unidos, a melatonina é vendida há muito tempo livremente em qualquer farmácia, sem qualquer necessidade de receita médica. Já no Brasil, a comercialização da substância foi liberada em outubro do ano passado, pela Anvisa. São pontuais os casos em que é necessária a suplementação com melatonina em crianças, uma vez que estamos falando de uma substância que é naturalmente produzida em todos nós à partir do terceiro mês de vida. Nos Estados Unidos, onde o uso da melatonina é mais difundido, o próprio Centro Nacional de Saúde Complementar e Integrativa, um órgão que é ligado ao Instituto Nacional de Saúde, diz que o medicamento parece ser seguro para a maioria das crianças, se usado a curto prazo, mas admite que existem incertezas nas doses, administração, efeitos a longo prazo e se os supostos benefícios superam os riscos”, declara Jannuzzi.
A médica, com pós-graduação em Estudos do Sono, explica ainda que a melatonina é um hormônio produzido pela glândula pineal, que fica localizada em uma região mais profunda do cérebro. Ela é liberada na corrente sanguínea e regula os ciclos de sono e vigília, que também é chamado de ciclo circadiano. Esse ciclo é responsável por ajustar o funcionamento do corpo para o dia e para a noite. A melatonina é produzida durante a noite, mas começa a produção por volta das 17 horas, e seu pico ocorre de madrugada, mais ou menos as 3 horas da manhã. Além disso, ela ressalta que existem evidências de que as crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) apresentam níveis mais baixos de melatonina, por conta de deficiência na conversão da enzima N-acetil-serotonina, em melatonina. Por isso, com acompanhamento médico, podem precisar fazer uso exógeno da substância.
“A maioria das crianças não vai precisar usar melatonina. Se os pequenos estão com dificuldades para dormir, devem ser investigados alguns aspectos, em especial se está sendo feito um ajuste de ambiente para o sono das crianças. Como a melatonina é desencadeada pela escuridão, a produção do hormônio é interrompida pela luz. Por isso, não é recomendado o uso de celulares, tablets e outros eletrônicos, a partir das 18 horas, porque a luz branca e azul emitida por esses aparelhos causa uma ruptura na produção de melatonina, e consequentemente isso vai prejudicar o sono. Para saber se haverá ou não necessidade de suplementação de melatonina, as famílias devem procurar orientação médica adequada”, finaliza a Dra. Ana Jannuzzi.
Autoria: Dra. Ana Jannuzzi é médica, formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem pós-graduação em Pediatria pela Universidade Cândido Mendes, e pós-graduação em Estudos do Sono, pela UniBF, do Paraná.