Estudos sugerem que os momentos de estresse ao bebê ou à criança podem sobrecarregar o sistema cardiovascular e suprarrenal, além de prejudicar a formação da arquitetura cerebral
Com o avanço da ciência e estudo sobre Mecanismos Neurobiológicos, surgem cada vez mais pesquisas sobre dor fetal na vida intrauterina e em crianças recém nascidas. Mas, se desde pequenos a dor fizer parte da rotina, qual seria o impacto dela no neurodesenvolvimento infantil, se experienciada em excesso?
De acordo com o Dr. Tadeu Fernando Fernandes, PhD em Pediatria e Presidente do Departamento Científico de Pediatria Ambulatorial da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), se não tratada precocemente, ainda no início, a dor vai se cronificando e se tornando mais forte e persistente, fazendo com que seja mais difícil o tratamento. Esse quadro evolui e gera redução do limiar da dor e outras consequências que poderão se perpetuar por toda vida.
Por isso, segundo o médico, reconhecer, identificar e cessar a dor em sua fase inicial, seja em bebês ou em crianças, pode evitar consequências a médio e longo prazo.
Alguns estudos, como o de Ravi R. Bhatt1, publicado no Pediatric Research, mostram o real impacto da questão. “De forma genérica, a dor libera níveis altos de cortisol e adrenalina, gerando momentos de estresse ao bebê ou criança, que são responsáveis por sobrecarregar o sistema cardiovascular e suprarrenal, além de prejudicar a formação da arquitetura cerebral”, enfatiza.
Durante o Congresso Brasileiro de Pediatria, realizado em Natal em maio deste ano, diversos profissionais do setor debateram sobre questões importantes, como a produção de centenas de sinapses por segundo – responsáveis pela comunicação neural – que ocorrem ao longo dos primeiros dias de vida do bebê. “A dor é uma experiência que define a formação de sinapses relacionadas a experiências dolorosas. Assim, se essa criança passa por muitos momentos de dor, as sinapses relacionadas às dores serão acionadas diversas vezes, tornando-as mais frequentes e duradouras a longo prazo”, resume Dr. Tadeu.
Para Leila Carvalho, diretora de Medical Affairs da Johnson & Johnson Consumer Health, é importante educar sobre o tema e desfazer algumas crenças, quanto ao diagnóstico e manejo adequado. “O uso apropriado de analgésicos indicados para essa faixa etária, está entre as opções para manejo do estímulo doloroso”, diz.
Além disso, dados de bebês em UTIs que passaram por muitos procedimentos dolorosos apresentaram um Quociente de Inteligência (QI) mais baixo do que aqueles que não tiveram tantas vivências do tipo. Segundo o estudo de Ravi R. Bhatt1, publicado no Pediatric Research, 68% desses mesmos bebês podem desenvolver dor crônica, como enxaqueca e outras, a partir dos 10 anos, com impacto no bem-estar provavelmente pela vida inteira. Estudos também apontam que a dor na infância provoca a redução do volume cerebral, o que está relacionado à depressão e ansiedade, perda ou aumento de apetite e distúrbios do sono.2,3
“Com tantas consequências causadas pela exposição excessiva à dor, entendemos que o papel essencial dos pais é transformar a experiência de dor em acolhimento e cuidado. E nós, como profissionais da saúde, devemos prevenir o estresse que impacta diretamente no neurodesenvolvimento, com base em comportamentos e feições de dor dos bebês e crianças, além de, claro, prescrever o melhor medicamento para conter eventuais dores”, reforça Dr. Tadeu.
1 Bhatt, R.R., Gupta, A., Mayer, E.A. et al. Chronic pain in children: structural and resting-state functional brain imaging within a developmental perspective (2020). Link
2 Morag I1, et alCumulative pain-related stress and developmental outcomes among low-risk preterm infants at one year corrected ageEarly Hum Dev. 2017
3 Shimodera S1, Kawamura A, Furukawa TA Physical pain associated with depression: results of a survey in Japanese patients and physicians. 2012
Fonte: Dr. Tadeu Fernando Fernandes, PhD em Pediatria e Presidente do Departamento Científico de Pediatria Ambulatorial da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)