Mergulho na Fertilidade Masculina mostra Queda na Quantidade e Morfologia dos Espermatozoides

Em 45 anos, contagem de espermatozoides em homens caiu 51%. Estudos já apontaram que a qualidade do sêmen dos homens também diminuiu no período e o impacto da vida moderna pode estar diretamente relacionado a isso.

Pode parecer um problema distante, mas a Organização Mundial da Saúde já apontou que uma em cada seis pessoas sofre com infertilidade no mundo. Isso representa uma média de 15% dos casais que tentam engravidar e não conseguem por pelo menos um ano de tentativa. Embora muitas pessoas acreditem que esse é um problema feminino, já que a idade avançada diminui as chances de gestação, em pelo menos 50% dos casos há um fator masculino envolvido (mesmo que não seja um fator exclusivo). Um estudo recente publicado em agosto na Antioxidants declara: “Uma das principais certezas sobre a infertilidade por fator masculino é que este se tornou um dos principais problemas de saúde globais, sendo atualmente responsável por 20 a 30% dos casos de infertilidade em todo o mundo”. Um estudo publicado no final do ano passado na revista Human Reproduction Update mostrou que, num intervalo de 45 anos, a contagem de espermatozoides em homens de todo o mundo caiu em torno de 51% (a concentração de espermatozoides por mililitro de sêmen declinou de 101,2 milhões para 49 milhões no período de 1973 a 2018). “Estudos já mostraram que a qualidade média do sêmen dos homens vem caindo nas últimas 4 décadas. Houve queda na concentração, na motilidade e na piora da morfologia dos espermatozoides, o que traz um impacto direto na fecundação e desenvolvimento do embrião”, afirma o Dr. Rodrigo Rosa, especialista em reprodução humana e diretor clínico da clínica Mater Prime, em São Paulo. “Também sabemos que há um impacto da vida moderna e dos maus hábitos de vida nas causas da infertilidade. O tabagismo, o álcool, a má alimentação, o sedentarismo e a obesidade também dificultam a concepção de um filho”, acrescenta o médico.

 Além desses maus hábitos, a endocrinologista Dra. Deborah Beranger, pós-graduada em Endocrinologia e Metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro (SCMRJ), também aponta uma classe de substâncias chamada de “disruptores endócrinos” (ou desreguladores). “Eles estão em todos os lugares, agem por mecanismos fisiológicos pelos quais substituem os hormônios do nosso corpo, ou bloqueiam a sua ação natural, ou ainda, aumentando ou diminuindo a quantidade original de hormônios, alterando as funções endócrinas, o que traz consequências para a fertilidade. Poluição, agrotóxicos, cosméticos, plásticos, conservantes alimentícios e até mesmo tickets e recibos bancários podem conter essas substâncias”, diz a endocrinologista. Por conta da poluição, homens e mulheres que trabalham ao ar livre (agentes de trânsito, taxistas, motoristas de ônibus, etc) em cidades grandes tem maior dificuldade em engravidar, segundo o especialista em Reprodução Humana. “O excesso de exposição a produtos químicos provenientes da poluição e de agrotóxicos pode induzir a diversos tipos de danos no DNA, levando então a mutações que inviabilizam o espermatozoide, contribuindo para a infertilidade masculina. E indivíduos que são portadores de alelos que comprometem os mecanismos de defesa, como o sistema antioxidante, são ainda mais suscetíveis a esses danos”, afirma a Dra. Deborah. “Além disso, vários produtos químicos e seus metabólitos podem alterar a expressão de genes, inibindo-os ou ativando-os em excesso, o que pode levar a diminuição dos níveis de testosterona”, completa a endocrinologista.

A endocrinologista explica que há um termo usado nos estudos científicos para definir essa questão: Infertilidade por Estresse Oxidativo Masculino (MOSI). “É uma proposta de uma nova categoria para definir homens inférteis com altos níveis de estresse oxidativo. A oxidação das células pode ser proveniente da dieta com perfis pró-inflamatórios, do sedentarismo, da obesidade, dos vícios e da poluição”, diz a médica.

Segundo o Dr. Rodrigo Rosa, é o tabagismo e a dieta inadequada, independente do peso, que mais têm impactado a capacidade reprodutiva dos casais. “O cigarro possui milhares de componentes tóxicos como nicotina, alcatrão, zinco, níquel, chumbo, ácido cético, fenol, ácido fórmico e substâncias radioativas as quais afetam a fertilidade. Essas substâncias afetam desde a produção dos espermatozoides até a movimentação tubária (que faz com que o embrião percorra o caminho entre o ovário e o útero), a divisão celular, a formação do embrião e sua implantação”, diz o especialista. “Dados da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) apontam que homens fumantes têm três vezes mais chances de sofrerem de infertilidade quando comparados àqueles que não fumam”, afirma o médico

No caso da dieta, a alimentação com consumo exagerado de açúcar foi apontada como ruim, pois atrapalha a atuação de hormônios requeridos no processo de reprodução e também está envolvida na inibição do gene regulador de estrogênio e testosterona, segundo o médico. “Além disso, o consumo excessivo de açúcar pode levar a um processo inflamatório com consequente risco de estresse oxidativo, o que pode lesar o DNA de células germinativas, aumentar a frequência de mutações prejudiciais e desequilibrar a expressão de genes que atuam na reprodução, assim comprometendo o processo reprodutivo”, afirma a endocrinologista. E é importante destacar que isso acontece por conta do excesso de açúcar e independe do peso dos pacientes, que podem ser magros, mas ter uma má alimentação, o que prejudica a fertilidade.

No caso da obesidade, a capacidade reprodutiva masculina pode sofrer uma queda de até 50%. “O excesso de gordura corpórea interfere na produção adequada de hormônios. Mais especificamente no homem, há um aquecimento maior da região genital, prejudicando a produção de espermatozoides”, afirma a Dra. Deborah. A qualidade do sêmen também piora para homens com dietas com alto teor de carne vermelha (mais de três vezes na semana). “Como contraponto, sabemos que o consumo de legumes, verduras, frutas e alimentos ricos em gordura saudáveis (salmão, atum e sardinha) aumentam a chance de gravidez em até 30%”, destaca o Dr. Rodrigo Rosa.

Outro hábito que pode estar interferindo na fertilidade é dormir mal de maneira contínua. “O sono é fundamental para o bom funcionamento da hipófise, glândula presente no cérebro que é responsável pela produção de uma série de hormônios, inclusive daqueles responsáveis pela estimulação dos testículos. Logo, quando o período de repouso é curto ou de pouca qualidade, essa glândula não funciona da maneira como deveria, o que, consequentemente, interfere na fertilidade”, diz o Dr. Rodrigo. O trabalho por turnos, que perturba o ciclo circadiano, também preocupa, por aumentar os níveis de estresse. “Altos níveis de estresse podem tornar as chances de um casal engravidar menores. Isso porque o estresse causa processos fisiológicos que podem interferir na produção de hormônios reprodutivos importantes, além de, no homem, favorecer o surgimento de proteínas inflamatórias que prejudicam a qualidade do esperma”, completa a endocrinologista.

Por fim, o médico enfatiza que um estilo de vida saudável, adotando uma alimentação balanceada, dormindo bem e praticando exercícios físicos com regularidade, é a melhor maneira de manter o bom funcionamento do organismo e assim melhorar a fertilidade e as chances de gravidez. “No entanto, caso o casal perceba que está tendo problemas para engravidar, é importante que ambos consultem um médico especializado, já que apenas ele poderá realizar uma avaliação e identificar a real causa do problema, recomendando assim o tratamento adequado ou, quando a causa da infertilidade não pode ser revertida, métodos de reprodução assistida”, finaliza o Dr. Rodrigo.

fonte:

DR. RODRIGO ROSA: Ginecologista obstetra especialista em Reprodução Humana e sócio-fundador e diretor clínico da clínica Mater Prime, em São Paulo, e do Mater Lab, laboratório de Reprodução Humana. Membro da Associação Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA) e da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana (SBRH), o médico é graduado pela Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM). Especialista em reprodução humana, o médico é colaborador do livro “Atlas de Reprodução Humana” da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana. Instagram: @dr.rodrigorosa

DRA. DEBORAH BERANGER: Endocrinologista, com pós-graduação em Endocrinologia e Metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro (SCMRJ) e pós-graduação em Terapia Intensiva na Faculdade Redentor/AMIB. Com cursos de extensão em Obesidade, Transtornos Alimentares e Transgêneros pela Harvard Medical School, a médica tem MBAs de Saúde e Qualidade de Vida, de Marketing e Branding Médico e de Mindset, todos pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), e curso de Obesidade e de imersão em Medicina Culinária pela Universidade de Campinas (UNICAMP). Fez Fellowship pela European Association for the Study of Obesity, em Portugal; é speaker dos laboratórios Servier, Novo Nordisk, Novartis, Merck, AstraZeneca, Lilly e Boehringer. Instagram: @deborahberanger

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