É preciso mudar o tom da conversa sobre a perda de peso para que o comportamento social em relação ao obeso mude também
Se as coisas fossem simples, já teríamos caminhado muito na direção do controle daquela que ainda é considerada a Doença Crônica Epidêmica Não Transmissível (DCENT) mais frequente dos séculos XX e XXI: A OBESIDADE.
E quando ela afeta as crianças, o mundo muda, promovendo transformações mais definitivas e permanentes.
“A obesidade é uma questão multifatorial e assim deve ser abordada. Não há culpados, não há um fator isolado que deva ser analisado. Isso pode ser comprovado pela enxurrada diária de novos artigos e abordagens sobre o tema. Aqui, abordamos alguns estudos recentes sobre a influência da vida da mãe no maior risco de sobrepeso e obesidade de seus filhos. E esses seriam fatores controláveis, desde que diagnosticados precocemente e acompanhados de forma adequada”, afirma o pediatra e homeopata Moises Chencinski.
Mães já engravidam com sobrepeso
Esse estudo publicado no site do CDC (Central for Disease Control and Prevention) é um relatório sobre características de IMC (Índice de Massa Corporal) das mulheres antes de engravidarem, que tiveram seus bebês incluídos nos dados de Certificados de Nascimentos de 2014 (96% de todos os partos).
Os dados mostram que cerca de 50% das mulheres apresentavam sobrepeso ou obesidade, antes de engravidarem, e essa situação é a mais grave de todos os tempos já relatada nos Estados Unidos e que esse é um dos fatores que contribuem para a epidemia de obesidade no país.
“Entre as principais consequências diretas desse fato estão maiores chances de diabetes gestacional e hipertensão arterial, que podem aumentar as chances de parto cesariana, que pode trazer mais complicações posteriores para as mães e para os bebês”, observa Moises Chencinski.
Alimentação materna na gestação afeta flora bacteriana intestinal do bebê
Que o tipo de parto (vaginal ou cesariana) pode mostrar uma colonização intestinal diferente no bebê já é fato conhecido. Isso pode determinar riscos maiores de sobrepeso e obesidade em crianças em faixas etárias posteriores.
O surpreendente nesse estudo, publicado no Genome Medicine, foi a observação que as gestantes que ingerem maiores quantidades de gordura do que a desejável também podem interferir na formação da microbiota intestinal dos bebês e, assim, afetar o desenvolvimento do sistema imune e a evolução de peso do bebê.
Enquanto o Institute Of Medicine (IOM) indica uma média de 20-35% de ingestão de gordura, em mais de 150 gestantes que fizeram seu recordatório alimentar a taxa variava entre 14-55% (média de 33%).
“Os bebês de gestantes de alta taxa de ingestão de gordura apresentavam, em sua flora bacteriana intestinal avaliada, tanto ao nascimento, quanto semanas após o parto, menos Bacteroides (“flora do bem”) do que as que tinham uma ingestão de gorduras mais adequada”, informa o médico, que é membro do Departamento de Pediatria Ambulatorial e Cuidados Primários da Sociedade de Pediatria de São Paulo.
Parto cesariana e o risco de obesidade na infância e adolescência
A formação da microbiota intestinal das crianças nascidas de parto via vaginal é mais adequada e protege tanto contra infecções, quanto alergias, mas também, em relação ao risco de sobrepeso e obesidade na infância e na adolescência.
Estudo recente, publicado no JAMA Pediatrics (Journal of American Medical Association), mostra um acompanhamento surpreendente, realizado entre setembro de 1996 a dezembro de 2012 entre os participantes do Growing Up Today Study. Foram avaliados pouco mais de 22.000 partos de 15.271 mães, seguidos em um questionário entre as idades de 9-14 anos até 20-28 anos.
“Os dados comprovaram, nesse estudo, um risco 15% maior de sobrepeso e obesidade em crianças nascidas por parto cesariana. Em famílias onde irmãos nasceram por vias diferentes (um via vaginal e o outro via cesariana), os que nasceram por parto cesariana tiveram 64% mais de chances de sobrepeso e obesidade do que os nascidos por parto normal”, destaca o pediatra.
Entre esses partos considerados na pesquisa, a maioria deles ocorreu em cesarianas sem indicação clínica (por opção do médico ou da mãe). Outros fatores também podem contribuir para esse desfecho (obesidade / sobrepeso) como a dieta da mãe, se houve diabetes gestacional ou não e se o bebê foi amamentado ou não. Mas esses fatores foram estatisticamente corrigidos na pesquisa.
Diabetes gestacional aumenta em 53% o risco de obesidade nas crianças
De acordo com uma nova pesquisa publicada no jornal online Diabetologia, realizada em 12 países (África do Sul, Austrália, Brasil, Canadá, China, Colômbia, Estados Unidos, Finlândia, Índia, Quênia, Portugal, Reino Unido), mulheres com diabetes gestacional aumentam em 53% o risco de obesidade e sobrepeso em seus filhos entre 9-11 anos. De acordo com critérios da American Diabetes Association e da Organização Mundial de Saúde (OMS), a prevalência de diabetes gestacional nessa amostragem foi de 4,3% dos partos.
Segundo os pesquisadores, o mecanismo pelo qual a exposição ao quadro de diabetes intra-útero aumenta os riscos de sobrepeso nos bebês não está completamente esclarecido. “Possivelmente, o crescimento fetal no útero desses bebês, submetidos a índices mais altos de glicemia materna, levando a um aumento de níveis hormonais fetais pode estar envolvido no processo. O diabetes mellitus gestacional pré-natal também pode ter influência na expressão dos genes do feto (epigenética) que dirigem o acúmulo de gordura corporal ou o mecanismo metabólico relacionado”, explica o pediatra.
“Pesquisas e mais pesquisas sobre a obesidade são necessárias, pois essa história de comer menos, se exercitar mais e fornecer uma dieta pronta para todos não está funcionando. Estamos perdendo a batalha contra a obesidade. Os profissionais de saúde precisam se certificar de que os pacientes compreendem perfeitamente os diversos fatores que contribuem para o excesso de peso, incluindo genética, composição dos alimentos, saciedade, dentre tantos outros”, defende.