Até hoje eu me lembro de quando era criança e chegava o “Dia da Vacinação”. Algumas vacinas vinham em gotas, outras, em um tipo de revólver de pressão que injetava a vacina, mas o medo de todas as crianças era por não saber “se ia doer”. Nossos pais sempre nos acalmavam dizendo: “não vai doer nada”. Contudo, o importante era que todos aderiam, tinha vacina para todos e a mobilização era geral. E olha que eu estou falando da década de 60
A cultura da vacina sempre esteve enraizada na vida do povo brasileiro, mormente após o advento de doenças graves como a poliomielite, fazendo com que os pequenos já nasçam com compromissos agendados para os primeiros 15 meses de vida, período em que, de forma inadiável, devem comparecer ao posto de saúde para receber as vacinas previstas no Programa Nacional de Imunizações (PNI). Aí temos a famosa tríplice viral, que combate o sarampo, a rubéola e a caxumba, além da vacina combinada para prevenir difteria-tétano-coqueluche, entre outras.
O grande problema é que, segundo a pesquisa Ibope Inteligência de 2020, embora 90% da população reconheça a importância das vacinas, três em cada dez crianças brasileiras não estão vacinadas contra doenças fatais. Aliás, a Unicef emitiu um alerta segundo o qual, desde 2015, ocorre uma queda da cobertura vacinal entre menores de 5 anos. Com a pandemia, a situação piorou. De acordo com a entidade, em 2019 a imunização contra sarampo, caxumba e rubéola era de 93,1%, já em 2021, os números caíram para 71,5%.
O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza 18 vacinas para crianças e adolescentes, uma dessas é a que imuniza contra a poliomielite, doença erradicada em 1994 e causada por um vírus do intestino que costuma atingir crianças menores de 4 anos. Quando grave, pode causar sequelas permanentes, como paralisia, insuficiência respiratória e óbito. Enfim, o Brasil de hoje, em virtude de um sabotamento vacinal, tem uma das mais baixas coberturas vacinais dos últimos 20 anos, portanto o Brasil pode sim, por falta de vacinação, viver o pesadelo do retorno de doenças erradicadas. O baixo investimento na área da saúde, a ameaça de privatização e os constantes ataques ao SUS podem trazer de volta doenças como tuberculose, paralisia infantil, sarampo, caxumba, rubéola e catapora.
Essa onda negacionista precisa ser vencida através da ciência, conscientizando a população da importância de se vacinar, dando à Saúde Pública sua devida importância, com o aumento de investimentos e a defesa inconteste do Sistema Único de Saúde, priorizando a população pobre, mais vulnerável, uma vez que já sofre com a desnutrição sistêmica. Precisamos voltar a ouvir o choro das crianças no dia da vacinação e o país novamente sussurrando, para o bem de seus filhos, “não vai doer nada”, promovendo uma vida saudável para as futuras gerações. O Brasil merece isso.
Fonte: Fernando Rizzolo é advogado, jornalista, mestre em Direitos Fundamentais