A partir do segundo ano de vida a criança passa a viver num mundo de faz-de-conta, paralelo ao mundo real, e que é repleto de seres imaginários.
Como o mundo real ainda lhe é difícil de ser assimilado e aceito, ela cria o seu próprio universo, onde tudo é possível e tem solução. É a fase do pensamento mágico e das projeções.
Nesse seu universo habitam super-heróis, mitos, fadas e monstros, capazes de brincar com ela, bem como fazê-la rir, sentir medo e chorar e, acima de tudo, ajudá-la a se desenvolver.
Como toda fase, um dia passa; para uns mais cedo, para outros mais tarde. Porém, é esperado que, por volta dos seis, sete anos de idade isso tenha terminado, uma vez que já terão se desenvolvido várias funções como a memória, a lógica e a inteligência.
Surge, então, na criança, uma ansiedade tão intensa e aflitiva, que não tem necessariamente relação com qualquer experiência assustadora anterior e cuja origem vai ao encontro do momento de vida que atingiu, quando se inicia a retirada das fraldas e o treino ao penico, o que significa que deve assumir o controle do próprio corpo.
Isto é muito angustiante, pois o fracasso significa decepcionar as figuras parentais que lhe são tão significativas e por quem ainda é tão dependente física e emocionalmente.
A criança expressa seus conflitos através do medo do escuro, de estranhos, de situações novas, do trovão, relâmpago, vento e outros temores que não se constituem fobias. Sente-se fragilizada diante de emoções desconhecidas e que não consegue dominar e compreender.
Daí a necessidade de criar um universo só seu. Na sua lógica, se os super-heróis conseguem subjugar o mal, ela também consegue; ou seja, se eles resolvem seus conflitos, ela também pode fazê-lo. Esses pensamentos mágicos lhe dão um sentido de poder muito forte e contribui para diminuir a sensação de fraqueza e de impotência diante dos adultos.
Assim, ela atribui vida aos objetos e brinquedos, depositando neles seus próprios sentimentos (projeções). É o ursinho de pelúcia que está com raiva porque a mãe brigou com ele ou o soldadinho está triste porque o pai dele foi trabalhar e não o levou junto… enfim, a criança brinca com os bonecos e bichos de pelúcia, como se fossem pessoas de verdade. Desta maneira, ela se liberta, sem culpa, de seus sentimentos negativos, ao expressá-los através dos brinquedos e objetos.
Neste momento, faz-se necessário o redobrar de cuidados, principalmente com janelas ou objetos que ofereçam perigo, pois a criança pode se sentir tentada a imitar o modo de atuar de seus personagens.
Por volta dos três anos, a criança inventa um companheiro imaginário para conversar e brincar. Geralmente este personagem é bom, prestativo e é dirigido e comandado por ela, o que lhe dá uma sensação de controle e poder.
Apesar dos monstros serem figuras aterradoras, os pais não precisam se alarmar, pois justamente por serem criaturas do mal sempre acabam derrotados nas histórias e nos desenhos.
Dentre os mitos, os mais simpáticos e bonzinhos são o Papai Noel e o Coelhinho da Páscoa, pois lhe dão presentes, o que fortalece e enriquece seu senso de auto-estima, por se sentir uma pessoa importante.
Assim, acreditar em Papai Noel é um dos mais significativos encantos infantis e nenhum adulto deve quebrá-lo. Ele é o símbolo do pai bom, compreensivo, amoroso e um notável substituto do pai biológico por ocasião do Natal, principalmente para a criança que não o tem presente na vida cotidiana.
Todas estas fantasias têm a função de equilibrar emocionalmente a criança, permitindo a elaboração e dissipação da angústia e o aplacamento da ansiedade. Funcionam, inclusive, como um processo de autodefesa e de auto-afirmação.
Através do faz-de-conta, a criança aprende também a entender o ponto de vista de outra pessoa, desenvolve habilidades na solução de problemas sociais e a torna mais criativa, acelerando seu desenvolvimento intelectual.
Esta é, portanto, uma etapa fundamental do desenvolvimento infantil, pois é através dela que a criança tenta elaborar seus conflitos e organizar simbolicamente o mundo real.
Os pais não devem participar ativamente do imaginário mirim, nem incentivar ou reprimir. Com o tempo vai declinando de intensidade até desaparecer por completo, como se nunca tivesse existido. Geralmente coincide com um maior domínio da linguagem e com a abertura de novos caminhos para a descarga emocional da criança.