Na história da humanidade, a desigualdade entre homens e mulheres sempre marcou as relações sociais e definiu os papéis sexuais. Deste modo, na cultura ocidental coube ao homem trabalhar e garantir o sustento do lar.
Às mulheres foram destinados os afazeres domésticos e os cuidados com os filhos. Com a sociedade assim organizada, com o passar do tempo, as mulheres foram ficando vinculadas à idéia da maternidade para “tornarem-se plenas”. A capacidade de gerar um filho foi reconhecida como “natural” em todas as mulheres, bem como o desejo da maternidade.
No entanto, com o advento da Primeira Guerra Mundial, as mulheres tiveram que sair de suas casas para cuidarem de feridos em hospitais, cultivarem o campo e ocuparem os postos dos homens nas indústrias. A guerra proporcionou maior liberdade, responsabilidade e novas perspectivas profissionais às mulheres. Desta forma, cada vez mais integrada ao sistema produtivo, a maternidade passou a não ser mais o centro da vida das mulheres. A vida profissional e a afetiva passaram a ocupar lugares de destaque no universo feminino.
Uma nova mãe
Mesmo em meio a tantas transformações e conquistas, o desejo da maternidade continuou sendo muito valorizado pelas mulheres. E, aqui, devemos diferenciar o desejo de maternidade da mulher moderna daquele que existia antigamente, uma vez que todas as mudanças sociais que ocorreram no decorrer de anos levaram a um amadurecimento deste processo.
Hoje, o aspecto mais valorizado pela mulher é a liberdade de ser responsável por seu próprio caminho. A maternidade deixou de ser o único objetivo da vida da mulher, passando a ser uma das possíveis escolhas em busca de seu desenvolvimento pessoal.
A maternidade é um dos caminhos para que as mulheres possam se realizar e sentirem-se produtivas. O desejo de filhos está bastante interiorizado na maioria delas, fruto de uma conquista histórica e passado de mãe para filha através de processos identificatórios. Sendo assim, a notícia da infertilidade pode abrir um vazio quanto ao referencial feminino, principalmente se não houver abertura para a análise de outras possibilidades onde se possa “se sentir mulher”.
Associada à questão sócio-cultural que não deve ser desconsiderada, é interessante destacar também que o desejo de filhos data desde a primeira infância, onde podemos ver meninas brincando com seus “bebês imaginários”, adiando, assim, a concretização deste desejo para a vida adulta.
Tendo em vista todos os fatores até agora expostos, nota-se que ter filhos acaba sendo um dos importantes pilares da construção da identidade feminina. Entre as mulheres com dificuldade para engravidar é comum o sentimento de que não conseguir ser mãe é como não ser completamente mulher. Desta maneira, podemos compreender melhor todos os sentimentos envolvidos na busca do filho desejado: “ansiedade a mais”, “preocupação a mais”, “desejo de engravidar maior que as outras mulheres”, como se sem este “a mais”, a gravidez não pudesse acontecer.
Podemos afirmar que este “a mais” de investimentos, na verdade, nos revela um “a menos” no campo da feminilidade. A busca centrada no filho faz com que esta mulher se esqueça que além da maternidade existem outras possibilidades de investimentos férteis e gratificantes, enquanto o bebê não vem.