E o porque à subnotificação de casos. Especialista explica situações típicas e avalia PL que pretende oferecer prioridade no atendimento das vítimas
No mês da mulher, muitas conquistas são celebradas, como o direito ao voto, o crescimento do número de mulheres no mercado de trabalho, o maior número de líderes femininas em diversos segmentos da economia e na política, entre outras boas notícias. A má notícia é que as mulheres vítimas de violência vivem aprisionadas em uma rede que as impede de se libertar do parceiro agressor. E não se trata apenas da violência física.
“A violência patrimonial, ainda pouco debatida, retira da mulher sua condição de cidadã”, avalia Tatiana Naumann, advogada sócia do Albuquerque Melo Advogados e especialista em Direito de Família e Sucessões e no atendimento de mulheres vítimas de violência.
Entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades, a violência patrimonial é tipificada na Lei Maria da Penha, Capítulo II, art. 7º, inciso V.
“Não pagar pensão alimentícia, por exemplo, também pode ser um ato enquadrado como violência patrimonial”, esclarece Naumann. Segundo ela, causar a hipossuficiência econômica da mulher também é uma forma de violência. “É uma forma de exercer controle sobre a parceira, e geralmente, praticada quando a mulher decide se separar, conforme esclarece o Dossiê Mulher 2021, elaborado pela Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro”, explica.
Outras formas de violência patrimonial são: controlar o dinheiro, destruir documentos pessoais; furto, extorsão ou dano; estelionato; privar de bens, valores ou recursos econômicos; causar danos a objetos da mulher ou dos quais ela goste; invasão de domicílio.
PL assegura prioridade na emissão de documentos pessoais
Em análise na Câmara dos Deputados, o PL 4411/21 busca assegurar à mulher vítima de violência patrimonial – que tenha resultado na retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus documentos pessoais ou de seus dependentes pelo agressor – prioridade imediata no atendimento para a emissão de novos documentos.
A medida vale para a emissão de documentos por órgãos do Poder Público, cartórios, instituição ou conselho de classe e união estudantil, em âmbito nacional, independente de senhas ou marcações prévias. A medida se aplicará a todos os documentos oficiais, como carteira de identidade (RG), Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), Carteira de Trabalho e Previdência Social, carteira de estudante, Carteira Nacional de Habilitação (CNH), entre outros.
Tatiana Naumann avalia que a medida pode auxiliar as mulheres vítimas de violência ao dar prioridade na emissão de documentos, estes indispensáveis para que a mulher possa praticar os atos civis do dia a dia, reinserindo-se assim na sociedade. “É importante destacar que o agressor deixa a vítima alijada do convívio social ao subtrair documentos, por exemplo, ou mesmo ao privar a mulher de recursos financeiros, o que pode dificultar ainda mais a notificação dos atos de violência”, ressalta a especialista.
A prioridade no atendimento se dará mediante a apresentação de um dos seguintes documentos: termo ou declaração de encaminhamento expedido por unidade de apoio jurídico e psicossocial para vítimas de violência doméstica, que ateste a necessidade de emissão do novo documento; cópia do boletim de ocorrência emitido por órgão policial, em que conste a descrição do documento extraviado ou destruído; ou termo de medida protetiva de urgência expedido pelo juiz da comarca competente.
A proposta será analisada em caráter conclusivo pelas comissões de Defesa dos Direitos da Mulher; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Tatiana Naumann, advogada
Albuquerque Melo Advogados e especialista em Direito de Família e Sucessões e no atendimento de mulheres vítimas de violência.