Amigos imaginários

Reconhecer o que é uma fantasia saudável e um comportamento mentiroso preocupante é uma tarefa que requer muita atenção.

_Vem Totó!

Depois dessa frase qualquer pai ou mãe se preocuparia ao ver seu filho dialogando com o “nada”.

Saber filtrar o que presenciamos ou ouvimos dos pequenos é uma tarefa bastante complexa.

É preciso cautela para discernir se a criança está mentindo para conseguir a atenção ou usando sua imaginação por meio da fantasia e de seus amigos imaginários.

Um mecanismo que os pequenos costumam utilizar é supervalorizar fatos para conseguir olhares clementes ou a isenção de responsabilidade. Deve-se sempre conferir as informações fazendo perguntas genéricas, “jogando verde” tais como: “Como foi o seu dia?”, “De que você brincou?”.

Criança sentada em um guarda-chuva como um barco, olhando para uma árvore com arco-iris atrás - foto: Angela Waye/ShutterStock.com

Ao ouvir um relato fantástico de uma criança a postura mais prudente é não acreditar de imediato no enredo, muitas vezes rico em detalhes. Quando a criança chega em casa contando, por exemplo, que apanhou de um coleguinha ou do professora ela pode estar superdimensionando uma bronca ou discussão que tenha presenciado mesmo que não tenha sido com ela.

Para crianças de até sete anos é comum fantasiar. O excesso de fantasia pode indicar um egocentrismo exacerbado, ao passo que a falta pode revelar um amadurecimento prematuro que também não é o ideal. Nesta fase ainda é possível haver certa confusão em separar a fantasia de realidade. Por isso, é sempre bom acompanhar de perto uma criança que, por exemplo, acredita verdadeiramente que é um super-herói. Na medida em que crescem e amadurecem o discernimento entre fantasia e realidade fica cada vez maior.

Os amigos ocultos, imaginários ou invisíveis costumam preocupar os pais que se assustam ao ver o filho conversando ou discutindo “sozinho”. Entretanto, na primeira infância este é um comportamento esperado e saudável. No mundo de faz de conta, a criança é autoridade. Manda desmanda, dá bronca e se diverte, criando suas histórias e resolvendo seus conflitos. A criança adota o amigo, invisível ou concreto, que pode ser um bichinho de pelúcia, uma boneca, ou até uma parte dela, com o qual interage e elabora seus dilemas.

Há também crianças que criam histórias mirabolantes: gatos cor-de-rosa, super heróis que entram em seu quarto para salvá-lo de leões, jacarés que andam no meio da rua, viagens ao redor do mundo realizadas no dia anterior… Desde que dosadas, sem demasias, também não devem gerar grandes preocupações.

Alguns fatores podem ser desencadeadores desses amigos ou personagens imaginários, como a hospitalização ou perda de um ente querido ou de um bichinho de estimação, a mudança de casa ou escola, ou ainda a falta de convivência com outras crianças. Os amigos imaginários são passivos, obedecem, não lhe tiram brinquedos e estão sempre disponíveis. É ou não é o amigo ideal?

Pais e educadores devem estimular a fantasia das crianças e proporcionar a elas um ambiente que permita a expressão da criatividade e imaginação. Esse comportamento ilustra a capacidade criativa da criança e deve ser respeitado, para que possam fazer de seu jogo simbólico mais uma ferramenta para a formação de uma personalidade íntegra e saudável.

Quando buscar auxílio?

A criança que passa a mentir de forma recorrente, descrevendo detalhes minuciosamente e seus enredos são tão ricos e verossímeis, que convencem os adultos que com ela convivem precisa de uma avaliação e acompanhamento de um profissional. Essas histórias, via de regra, colocam a integridade do outro em risco, podendo prejudicá-lo. Essa criança pode estar passando por momentos de tempestades emocionais promovidas pela perda de alguém querido, separação dos pais, nascimento de um irmão ou qualquer situação semelhante que o faça imaginar que não é mais aceito ou querido pelas pessoas mais importantes para ela.

As histórias fantásticas, os super-heróis ou fadas quando surgem em excesso podem indicar que a criança esteja se sentindo preterida ou carente e precisa se fazer chamar atenção por esse meio. Quando uma criança faz parte de um grupo em que, por exemplo, os amigos contam diariamente programas ou viagens interessantes que fizeram, descrevendo inúmeras peripécias de passeios realizados com papai, mamãe ou avós, e se ela não teve recentemente uma experiência prazerosa para compartilhar pode inventar sua história mágica e maravilhosa para se sentir incluída e amada também. Mais uma vez, se for um fato isolado, esporádico não deve, a priori, preocupar. Mas, se tornarem frequente e recorrente, recomenda-se também uma avaliação psicopedagógica.

Uma regra vale sempre: nada em excesso é saudável!

Mas lembre-se: criatividade, brincadeira, fantasia e imaginação fazem parte da infância e de um desenvolvimento saudável. Portanto, estimule, brinque e pergunte às crianças sobre suas histórias fantásticas. Elas farão delas indivíduos mais seguros, felizes e aptos a resolver seus conflitos.

Karen Kaufmann Sacchetto

Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento;Especialista em Distúrbios de Aprendizagem;Psicopedagoga;Pedagoga;Consultoria pedagógica e Tutoria ed...

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