Meu filho nasceu com síndrome de Down. E agora?

Às vésperas do Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, Instituto Serendipidade  mostra as etapas para uma vida com autonomia e protagonismo  

Quando nasce um bebê com alguma deficiência, os pais costumam sentir medo e desamparo. Junto destes sentimentos, é natural surgirem também muitas dúvidas. O que fazer, a quem recorrer, que cuidados deve-se tomar, como será o futuro são algumas das questões que passam pela cabeça de todos. Para ajudar neste processo, o Instituto Serendipidade, que atua pela inclusão de pessoas com deficiência intelectual, criou o projeto Laços, que faz a ponte entre famílias que precisam de orientação e pais que já têm muito o que ensinar, formando uma rede de apoio gratuita e de fundamental importância.  O acolhimento começou direcionado para casos de síndrome de Down e hoje já abrange outros 12 diagnósticos. Duzentas e três famílias já foram atendidas, algumas até no exterior, em países como Estados Unidos, Austrália,  Espanha e  Portugal, entre outros.  E, para tornar a troca de informações ainda mais ampla, o Serendipidade, às vésperas do Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, celebrado em dezembro,  conversou com diversos especialistas, entre médicos, educadores e profissionais de Educação Física, para mostrar as principais etapas de desenvolvimento de uma uma criança que nasce com T21 para ter uma vida com autonomia e protagonismo. Estima-se que, no Brasil, 1 em cada 700 nascimentos são de  crianças com síndrome de Down.

De forma abrangente, os especialistas falam sobre sobre os cuidados com o recém-nascido, as terapias que ajudam no desenvolvimento, além de oferecer dicas para a escolha da escola e a inserção no mercado de trabalho. Não ficam de fora os desafios da adolescência e do envelhecimento. Todos lembram que a síndrome de Down é apenas uma das características da pessoa. Seu filho poderá alcançar um bom desenvolvimento de suas capacidades pessoais e ter autonomia. Ele, como todos, poderá aprender, se divertir e trabalhar. Confira agora as recomendações:

O bebê nasceu. O que fazer?

Na maior parte das vezes, os pais descobrem que o bebê nascerá com T21 no pré-natal, mas, em alguns casos, o diagnóstico só é feito após o parto. Nas duas situações, é preciso que os profissionais de saúde tenham cuidado na abordagem. “Quando o médico traz a notícia de forma positiva, mostrando tudo que o bebê será capaz de fazer, é muito melhor do que quando ele diz que é uma tragédia. Se a conversa inicial é ruim, os pais têm que apagar diversas fogueiras ao longo da trajetória. Os profissionais precisam dizer que a condição é apenas mais um exemplo da diversidade da Humanidade”, diz a pediatra Ana Cláudia Brandão, do Centro de Especialidades Pediátricas do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

Ela lembra que, nesta fase, são necessários alguns exames, como a ecocardiografia, que identifica possíveis cardiopatias, frequentes em pessoas com T21.  Outro passo importante é fazer uma triagem auditiva. Em crianças com síndrome de Down, é recomendado, além do teste da orelhinha, obrigatório para todo recém-nascido, o exame BERA, realizado quando há algum risco de perda auditiva devido a condições genéticas. 

A pediatra também explica que catarata congênita, estrabismo e miopia são frequentes entre pessoas com T21. A consulta com um oftalmologista é necessária para que os pais descartem problemas ou aprendam a tratá-los. Durante o teste do pezinho, é importante ficar de olho nos marcadores que indicam hipotireoidismo, já que alterações na tireoide são frequentes em quem nasce com T21.

As terapias também são fundamentais para o desenvolvimento do bebê. A hipotonia, uma frouxidão muscular que é uma das condições das pessoas com síndrome de Down, pode dificultar a amamentação, diz a pediatra. A ajuda de um fonoaudiólogo nesta fase é prioritária, assim como no momento de desenvolvimento da fala. O fisioterapeuta é outro profissional de grande importância. Será ele quem trabalhará  a sustentação do pescoço, depois de braços e pernas. “Crianças com síndrome de Down atingem alguns marcos, como sentar, andar, um pouco mais tarde, mas conseguem”, diz a pediatra do Hospital Albert Einstein. 

Ana Cláudia recomenda ainda que o incentivo da autonomia  seja feito desde cedo. “Ensine seu filho a organizar os brinquedos, tirar o prato da mesa, escolher a roupa. Autonomia é um processo e, à medida que o tempo passa, a gente dá mais funções e desafios. Pessoas com síndrome de Down são capazes de fazer quase tudo”, diz.

Hora de escolher a escola

O desenvolvimento de toda criança passa pela educação. Mas será que qualquer escola está apta para receber uma criança com síndrome de Down? Para a pedagoga Maria Teresa Egler Mantoan, coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença (Leped), da Unicamp, não há dúvidas de que sim. Crítica dos colégios ditos “especiais”, ela defende que “não há outra escola senão a de ensino regular. Instituições especializadas que abrem escolas estão iludindo os pais”. Mas, ressalta ela, é preciso ficar atento e observar uma condição, se o espaço conta com um profissional de Atendimento Educacional Especializado. “Será ele quem vai investigar as barreiras físicas, linguísticas, comunicacionais e longitudinais que possam impedir o acesso e participação do aluno à escola”, explica Maria Teresa.

Hora de praticar esportes. 

Professor de Educação Física e instrutor do Programa de Iniciação Esportiva do Instituto Serendipidade, Sandro Benzi diz que para cada faixa etária  é necessário um estímulo diferente. Dos 3 aos 10 anos, por exemplo, as habilidades estabilizadoras, manipulativas e locomotivas devem ser continuamente estimuladas. “Não existem exercícios específicos, e sim tudo o que envolve subir, descer, pular, se equilibrar, como bambolê”, diz Sandro. A partir dos 10 anos, já é a hora de introduzir esportes. A dica é procurar atividades perto de casa, das quais a criança goste. Futebol, natação e judô costumam agradar. Dos 14 anos em diante, a musculação é uma boa ideia.  “Ela mantém a massa magra e ajuda na prevenção à osteoporose, um problema que costuma afetar idosos e pessoas com T21 em idades anteriores ao esperado”. 

Hora de entrar no mercado de trabalho. 

Os desafios para a entrada no mercado de trabalho são grandes, como a falta de entendimento da melhor forma de comunicação, que não necessariamente precisa ser verbal. “Pode ser gestual, imagética, através de músicas”, explica Débora Goldzveig, gerente do Instituto Serendipidade.  A remuneração é outro ponto a ser observado — tem que ser a mesma de outras pessoas na mesma função. “As empresas também precisam saber que pessoas com SD podem necessitar de maior número de repetições para entender as tarefas. O empregador precisa adequar seu planejamento estratégico a este timing”, diz Débora, que sugere que pessoas com deficiência verifiquem se a empresa possui certificações e prêmios como Capitalismo Consciente, Selo municipal de Direitos Humanos, Great Place to Work. Também é um bom indicativo se ela é assinante do Pacto Global.

Ana Cláudia Brandão

Centro de Especialidades Pediátricas do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

Veja o perfil completo.

Deixe um comentário