No desafio de conciliar vidas pessoal e profissional, os espaços em que se vive e trabalha podem ser aliados no combate à exaustão física e mental
Segundo a International Stress Management Association no Brasil (ISMA-BR), 30% dos profissionais brasileiros sofrem da “Síndrome de Burnout”. O país já é considerado o segundo no mundo com maior número de vítimas da síndrome, com profissionais apresentando altíssimo nível de estresse especialmente associado ao trabalho.
Esse distúrbio é o resultado direto do acúmulo excessivo de estresse, tensão emocional e do trabalho e é bastante comum em profissionais que vivem sob pressão constante, como médicos, publicitários, professores etc. Toda essa pressão, ansiedade e nervosismo resultam, muitas vezes, em uma depressão profunda, que precisa de acompanhamento médico constante.
Além de cobranças excessivas, contribuem para o esgotamento profissional, a falta de gratificação, injustiças em relação a promoções e até se alguém é obrigado a ir contra os próprios valores éticos, entre outros pontos, porque tudo isso vai gerando um sentimento negativo que compromete a saúde mental das pessoas.
Recentemente, o príncipe Harry participou de uma live da empresa de coaching BetterUp e revelou que diversas vezes ele recorre a momentos de meditação para reflexões internas. E que, atualmente morando em Los Angeles, nos Estados Unidos, abdicou das ocupações como membro da realeza britânica e assumiu posições corporativas, como o cargo de “Chief Impact Officer” (diretor de impacto, na tradução livre) da própria startup Better Up.
Com as novas responsabilidades, apesar de terem sido uma escolha própria do príncipe Harry, vieram ainda muitas situações de estresse extremo e exaustão física e mental, segundo depoimento dele durante a live. Com isso, desenvolveu a Síndrome de Burnout.
Ainda na entrevista, Harry destacou a importância dos empregadores influenciarem e contribuírem com a saúde mental de seus colaboradores, incentivando-os a cuidarem de si mesmos. “Do ponto de vista do empregador, você não pode esperar que as pessoas trabalhem suas mentes se não lhes der tempo para fazer isso”, disse Harry na live.
“A falta de autoconhecimento das pessoas sobre como funciona o nosso cérebro e o nosso organismo também influencia no burnout. Porque ao tentar realizar múltiplas tarefas ao mesmo tempo, por exemplo, e que exijam muito foco, vai gerar frustração porque já temos evidências que comprovam que nosso cérebro não é capaz de fazer múltiplas tarefas ao mesmo tempo que exigem muita atenção”, reforça a especialista Gabi Sartori, arquiteta especialista em neurociência e co-fundadora do NeuroArq Academy.
AMBIENTE X SÍNDROME DE BURNOUT
Um dos principais fatores, quando consideramos o que pode influenciar na qualidade de vida das pessoas, é o ambiente de trabalho. Afinal, é nele que as pessoas ficam a maior parte do tempo ao longo dos dias. E é exatamente neste ponto que entra a neurociência aplicada à arquitetura, para analisar como criar espaços que possam contribuir com a saúde mental dos indivíduos.
O que levantou uma enorme discussão sobre “até que ponto vale a pena” comprometer a qualidade de vida e deixá-la em segundo plano, mesmo tendo tantas oportunidades e recursos financeiros a seu dispor em algumas situações.
“Uma das grandes consequências da pandemia é a questão da saúde mental, considerada, inclusive, a “quarta onda”, com altas taxas de transtornos de ansiedade, depressão e burnout. Temos como aliados neste momento a medicina integrativa. É uma área recente e estuda os 7 pilares do nosso estilo de vida que impactam na nossa saúde, tanto física quanto mental. E essas sete áreas se conectam diretamente com os ambientes físicos nos quais vivemos, afinal esses espaços fazem parte da nossa vida”, reforça Priscilla Bencke, arquiteta especialista em neurociência e co-fundadora do NeuroArq Academy.
A profissional explica que o burnout é a ausência de si mesmo, ou seja, não ter esse olhar para si. E neste caso é importante que os ambientes sejam propícios a te ajudar a olhar para si. “É construir espaços para que os colaboradores tenham momentos de descompressão, de desconexão com o trabalho, além de incentivá-los a relaxar. Temos, por exemplo, a biofilia, que utiliza detalhes da natureza em espaços projetados pela arquitetura para que o ser humano responda e interaja de maneira mais saudável aos ambientes”, explica Priscilla.
Isso porque, segundo a especialista, como o ser humano vem da natureza, há um sentimento de mais segurança e conforto quando a pessoa está em contato com elementos que remetam à natureza. “A biofilia já é considerada um dos 7 pilares que influenciam na qualidade de vida do ser humano. Com a biofilia conseguimos diminuir a ativação da amígdala cerebral, que é responsável pelas respostas emocionais do organismo e que imprimem emoções primárias, como medo, raiva e o instinto de sobrevivência”, afirma.
Segundo o estudo “O impacto global do design biofílico no ambiente de trabalho”, divulgado pela Human Spaces, o uso de elementos da natureza no ambiente de trabalho (mesmo que artificiais) aumenta a sensação de bem-estar em 15% e em 7% a produtividade.
Gabi Sartori conclui destacando que as formas utilizadas no ambiente também influenciam e há algumas pesquisas que comprovam isso. “Já temos evidências de que conseguimos relaxar, diminuir a ativação da amígdala cerebral e, consequentemente, diminuir ansiedade a partir da visualização de formas curvas num espaço. O que faz todo sentido porque esses formatos de curvas são formas da natureza, são formas orgânicas. Há também algumas evidências de aromas, como a lavanda, que também influenciam nessa sensação de relaxamento. Outro fator importante também é a iluminação, que provoca uma sensação de mais conforto. A luz branca, por sua vez, estimula de maneira completamente diferente da luz amarela em nível de relaxamento”, detalha.
Especialista Gabi Sartori, arquiteta especialista em neurociência e co-fundadora do NeuroArq Academy.
Especialista Priscilla Bencke, arquiteta especialista em neurociência e co-fundadora do NeuroArq Academy.