Retorno ao Trabalho com Aleitamento Materno é Benéfico para Mães e Empresas

Para a especialista em amamentação pela Universidade da Califórnia San Diego e mãe, Ana Carolina Ferreira, infraestrutura e acolhimento são as chaves para isso

Retornar ao trabalho após a licença maternidade pode ser um momento desafiador para muitas mães, em especial no que diz respeito a continuação do aleitamento materno. Apesar dos desafios, o último Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição (ENANI), feito em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro, a Fiocruz, o CNPQ e o Ministério da Saúde, mostrou um aumento de 15 vezes na prevalência de aleitamento materno exclusivo entre as crianças menores de 4 meses, e de 8,6 vezes entre crianças menores de 6 meses.

Estatística essa que pode ser ainda maior com a conscientização e medidas práticas dentro do ambiente corporativo para receber e incentivar o aleitamento materno entre essas mães lactantes. Segundo Ana Carolina Ferreira, especialista em amamentação pela Universidade da Califórnia San Diego (UCSD), manter a amamentação durante o retorno ao trabalho não só é possível, como também é benéfico para as mães e para as empresas. “Uma mãe que conta com uma infraestrutura para ordenhar no trabalho e se sente bem acolhida pelo seu time, se torna uma profissional mais feliz na empresa e, consequentemente, mais produtiva e comprometida”, explica.


Ana Carolina é uma das mães que fazem parte dessa estatística do estudo. Mãe dos pequenos Lucas e Thomas, a executiva de TI e especialista em amamentação, faz suas ordenhas no local de trabalho, que auxilia a família a manter um estoque de leite materno em casa, e a seguir com o aleitamento materno mesmo após o seu retorno à empresa. Com sua experiência e especialização, Ana vem trilhando uma jornada como consultora para conscientizar outras mães sobre essa possibilidade.

Ana Carolina Ferreira, especialista em amamentação pela Universidade da Califórnia San Diego (UCSD)

“Eu tive que retornar ao trabalho após o final da licença maternidade duas vezes, uma em 2018 e outra em 2022. Eu sou mãe, queria cuidar dos meus filhos, mas também queria retornar ao trabalho, continuar minhas realizações profissionais. Foi então que estudei, pesquisei e comecei o processo de congelamento do meu leite materno. Deu tão certo que algumas amigas minhas, que também tinham se tornado mães, começaram a pedir auxílio para também continuar o aleitamento, mesmo com o retorno ao trabalho. Então minhas consultorias são voltadas para que as mães façam um grande estoque de leite e consigam voltar ao trabalho em paz, sabendo o que a amamentação dos meus bebês está garantida e sem desperdiçar nenhuma gota”, explica a consultora.

Além disso, Ana Carolina Ferreira também defende que as empresas podem auxiliar as profissionais nesse retorno da licença maternidade, com acolhimento e infraestrutura. “As empresas podem oferecer uma infraestrutura adequada para a ordena de leite materno, ou seja, uma sala privativa, tranquila e com chave, para oferecer privacidade para esse momento de ordenha, três vezes durante o expediente. Uma poltrona, com uma tomada para o uso da bomba elétrica e uma pia também são fundamentais para isso. Além do local, também é importante que essa profissional tenha uma geladeira ou frigobar para armazenar o seu leite”, comenta a especialista.

Sobre o tempo de licença para ordenha durante o expediente, Ana Carolina sugere que a mãe faça uma negociação com a sua empresa sobre o assunto. “O que recomendo, tanto para as mulheres como para as empresas, é que haja uma negociação entre as partes, sobre como vai ser dividida a pausa para amamentação ou ordenha, que deve ser de uma hora, de acordo com a lei. Em relação as empresas, acredito que deve haver uma mudança cultural, com políticas específicas dentro das corporações que garantam esse retorno das mães ao trabalho, sem precisar interromper a amamentação para isso. Nos Estados Unidos, por exemplo, há uma legislação chamada Pump Act, que garante pausas para as mães amamentarem ou ordenharem, por um período de até um ano e onde as empresas ainda devem oferecer acomodações para isso. Mas o ponto negativo é que nos EUA, a licença maternidade é menor que no Brasil, sendo de apenas três meses e não seis”, explica a especialista em amamentação.

Outro ponto importante, além da infraestrutura, é sobre o acolhimento por parte da equipe. “A equipe daquela mãe deve ser orientada tanto pelo RH como pelos seus líderes sobre o acolhimento necessário para o retorno ao trabalho. Essa profissional vai precisar se ausentar, pelo menos, três vezes ao dia por 20 minutinhos, para fazer a ordenha. E isso não pode ser visto como um problema pelo seu time, uma vez que sair para fumar ou tomar um café não é. Investir em acompanhamento psicológico, orientações, palestras para as mães que amamentam e ações entre o time e a mãe são bem-vindas e geram acolhimento para essas profissionais.”, explica.

Segundo Ana Carolina, todos devem compreender que os benefícios de continuar a amamentação são diversos. “Para a mulher, pois existem estudos científicos que comprovam que o aleitamento materno protege a mãe do câncer de mama, câncer de colo de útero, diabetes, entre outras doenças. Para o bebê, que fica protegido de uma série de doenças, seja na infância ou a longo prazo. E para as empresas também, que terão as mães focadas no trabalho, porque estarão emocionalmente bem, sabendo que seus filhos continuarão a ter o seu leite. Além disso, apoiar e acolher as mães nesse momento, contribui com a imagem positiva das empresas no mundo corporativo”, completa a consultora.

Natalia Rodolpho Galli, mãe de Isabella, de 7 anos e dos gêmeos Pietro e Vittória, que vão completar 2 anos

A superintendente de Governança Corporativa, que mora em São Paulo, Natalia Rodolpho Galli, mãe de Isabella, de 7 anos e dos gêmeos Pietro e Vittória, que vão completar 2 anos, hoje entende que é possível conciliar retorno ao trabalho e aleitamento materno. Em sua primeira gravidez, ela retornou ao trabalho em seis meses, e logo desmamou sua filha Isabella. Ao retornar ao trabalho ela foi demitida, e ficou longe do mercado de trabalho por um ano. “Ou seja, por falta de informação, eu acabei desmamando minha filha, sem necessidade, e caí nas fórmulas. Na gravidez dos meus gêmeos, eu tive acesso a informação, já estava trabalhando em outra empresa e por meio da orientação de boas consultoras de amamentação consegui ter uma rotina de ordenha para ter um estoque de leite materno antes e durante o retorno ao trabalho e conseguir prolongar a amamentação dos meus filhos por mais tempo”, finaliza Galli.

O que diz a lei, quando o assunto é amamentação:

Do ponto de vista da legislação, aqui no Brasil, o artigo 396 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) prevê que, durante a jornada de trabalho, a mulher tem direito há dois intervalos de meia hora — totalizando uma hora. Esse momento tem a finalidade de oferecer a mãe um período para amamentar o seu bebê ou ordenhar, inclusive se a mulher tiver adotado uma criança. Isto deve ocorrer até que a criança complete seis meses de idade e os horários de descanso podem ser definidos entre empregador e empregada, individualmente. Ainda de acordo com a CLT, nos casos em que a saúde da criança exigir, o período de seis meses poderá ser aumentado. Além disso, os artigos 389 e 400 da CLT também preveem existência de locais destinados aos filhos que ainda estão no período de amamentação, com no mínimo, um berçário, sala de amamentação, cozinha dietética e uma instalação sanitária.

Além disso, tramita na Câmara e Senado, o PL 790/2021, que aumenta para dois anos o período de concessão obrigatória do intervalo para amamentação durante horário de trabalho. Em outros países, as legislações, no que diz respeito a licença maternidade, amamentação e ordenha, já são diferentes. Para se ter uma ideia, na Alemanha e em muitos outros países europeus, as mulheres podem tirar até um ano de licença remunerada após o parto. Já nos Estados Unidos e Quênia, esse não é o caso, pois as mulheres têm menos tempo de licença remunerada, garantida por lei, após uma gravidez. E essa falta de políticas em prol do aleitamento materno mundo afora, abre caminho para o uso de fórmulas, como demonstrou o último relatório da OMS e da Unicef – O Impacto do Marketing na Promoção de Substitutos do Leite Materno. O relatório revelou que mais de US$ 55 bilhões são gastos anualmente na promoção de substitutos do leite materno.

Fonte: Ana Carolina Ferreira é mãe de Lucas e Thomas, gerente de compras de TI, e atualmente trabalha em uma grande empresa da área da saúde em Los Angeles, nos EUA, onde mora desde 2013. É consultora de amamentação formada pela Universidade da Califórnia San Diego Extension (UCSD). Atualmente ministra três cursos online: Faça seu estoque de leite materno, Volte ao Trabalho em Paz e Aumente sua produção de leite

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