Os métodos: É possível escolher?
Ainda temos muito a falar sobre o dormir, o não dormir, causas, transtornos de sono, mas hoje acho que já temos experiências e informações para que cada um possa avaliar o que escuta ou lê enquanto está acordado tentando fazer seu bebê dormir (essa foi maldade pura, rsrs. Desculpem).
A princípio, é interessante pensarmos um pouco a respeito do tema: fazer alguém dormir. Como fazemos alguém comer? Como fazemos alguém evacuar ou urinar? Temos mesmo esse poder?
Pensando em seres saudáveis, sem alguma patologia específica, assim como só come quem tem fome, só evacua ou urina quem tem vontade (e fezes e xixi), nada mais lógico pensar que só dorme quem tem sono. Não vejo nenhuma incoerência nessa linha de pensamento.
Se tivéssemos tempo, disponibilidade, um olhar diferente, um mundo sem tantas exigências, inclusive de performances, será que não teríamos menos dúvidas, menos dificuldades e menos problemas relacionados àquilo que é fisiológico?
Fisiologia (dicionário Michaelis): 1 Ciência biológica que estuda as funções dos seres vivos e, em geral, os fenômenos da vida. 3 O funcionamento do organismo vivo. Assim, tudo o que é fisiológico se refere ao funcionamento natural de um ser vivo. |
A questão é que, na maior parte das vezes não temos tempo, disponibilidade, o olhar é sempre o mesmo, as exigências são enormes, a cobrança de performance é constante e as nossas dúvidas e incertezas e inseguranças e choros e… são cada dia maiores.
Respire. Iiiiinnnnssssspireeeee. Eeeeexpiiiiireeeee. Relaxe. Sem cobranças, sem julgamentos, vou começar a descrever três dos métodos mais conhecidos e pensar junto com vocês sobre suas validades, seus limites. Vale lembrar que há defensores e contestadores de todos os métodos que eu conheço de se fazer um bebê ou uma criança dormir e que todos eles podem funcionar ou não, de acordo com sua persistência.
Já orientei muitos deles para meus pacientes, já tive sucessos e insucessos com todos eles e aprendi muito, mudando minhas opiniões, sempre que julguei possível e necessário até estabelecer minhas propostas de hoje em dia.
Além disso, é importante não julgar. Cada um conhece sua vida familiar, suas possibilidades, suas limitações. Vamos lá? Já se despiram dos preconceitos? Isso é importante para entender os métodos e aplicá-los (ou não) de acordo com sua cultura, sua necessidade, sua possibilidade.
O método Nana, Nenê
A sua teoria está em um livro (Nana, Nenê: Como Resolver o Problema da Insônia do seu Filho – Eduard Estivill e Sylvia de Béjar).
Muito controverso, esse é um método que ficou conhecido principalmente por deixar o bebê chorar até cansar (segundo seus críticos) e principalmente por iniciar uma rotina com hora de comer, de acordar e de dormir (segundo seus defensores).
Mesmo quem já o aplicou com sucesso reconhece que ele não é fácil de se executar, mas que no máximo em uma semana a “fisiologia do sono” estará iniciada ou restabelecida, de forma definitiva, mesmo com alguns casos de recaídas que são solucionados com a reaplicação do mesmo método.
As bases do método
– Uma das colocações é a de que o bebê não é A família, nem O CENTRO da família e sim PARTE da família. Por conta disso, é ele quem deve se adequar à rotina familiar e não o contrário. Tendo isso em mente, desde o início da vida de seu bebê, deve ser estabelecida uma programação que indique ao bebê como será a vida dele nessa família.
– Um dos conceitos contestados pelos autores do livro é a livre-demanda.
Livre-demanda é uma forma de amamentação em que o bebê determina sua necessidade alimentar (mamada ao seio). Não há uma regra até que o próprio bebê defina seu ritmo. Assim, os intervalos entre as mamadas, se ele vai mamar um ou os dois seios, quanto tempo ele vai mamar em cada mamada e qual vai ser a força de sucção são determinados por cada bebê. |
A orientação dos autores do método é a de que os horários devam ser estabelecidos pelos pais, contando com os seguintes passos:
- Hora de comer: manter o mesmo intervalo entre as mamadas e a mesma duração de cada mamada desde cedo. Assim, o bebê deve mamar em intervalos de 3 horas, contando-se de começo a começo de mamada, 15 minutos em cada seio (30 minutos ao total, no máximo).
- Hora de ficar acordado: através de banho, conversas, leituras, músicas, passeios, brincadeiras, tenta-se manter o bebê acordado por pelo menos uma hora após o final da mamada. Não balançar, não sacudir, não ninar para o bebê adormecer. Importante: não dar de mamar até o início da próxima mamada programada.
- Hora de dormir: O bebê deve ser colocado sempre no berço, sempre da mesma forma, sempre que possível acordado. Como no primeiro mês o bebê é muito sonolento, ele deve ser acordado a cada 3 horas para que mame em intervalos regulares. Não se deve permitir mamadas curtas e frequentes (livre-demanda), pois, mais dia, menos dia, isso irá interferir no sono noturno. Tentar não deixar seu bebê adormecer no peito enquanto mama, por mais difícil que seja no primeiro mês.
Seguindo essa linha, mais exemplificada e detalhada no livro (pelo método), pela rotina do dia, o sono da noite se regulariza. Ele pode chorar um pouco mais no primeiro dia, mas o choro vai diminuindo e o bebê se acostuma com a rotina determinada e passa a dormir de acordo com as expectativas da família.
Caso o bebê acorde durante a noite
Para isso não acontecer, é necessário que ele aprenda a dormir sozinho. Quando ele for colocado no berço, acordado, você pode ficar ao lado dele, sem contato visual direto (olhando para baixo) nem falar com o bebê. Ele pode olhar para você, mas você não deve olhar para o bebê, para que ele não queira brincar, se distrair, mexer com você e entenda que agora é a hora de dormir.
Se isso acontecer durante a noite, repetir esse mesmo processo. Assim, o bebê vai saber que não será abandonado, que você estará por perto quando ele necessitar. Mas evite excitá-lo ou pegá-lo no colo.
Minha opinião
Já indiquei e orientei esse método. Algumas mães se negaram a usá-lo. Outras usaram e pararam por não conseguirem deixar de atender as supostas necessidades de seus filhos. Outras usaram e tiveram sucesso.
Os que são contra o Nana, Nenê colocam as questões do choro, da rigidez de horários, do “desrespeito” ao bebê, da perda de sensibilidade e do vínculo, até de requintes de crueldade (como sentir no bebê a sensação de “desistir” e não de “se acostumar”) como fatores para desconsiderar e “abominar” o método.
O que eu pude perceber é que quem procura esse método chega normalmente em uma situação desesperadora com muitos problemas pessoais de sono, dificuldades importantes na volta ao trabalho, “surtando”, com seu casamento muitas vezes em risco (o pai já está dormindo na sala enquanto a mãe traz o bebê para o quarto, para os que não são adeptos à cama compartilhada, ou a mãe dorme no quarto com o bebê, em uma cama ao lado ou sentada na poltrona, “porque ele só dorme assim”).
Dessa forma, esses pais, que já “tentaram de tudo um pouco”, buscam uma fórmula que tenha solução rápida e garantida. Eu não me lembro de ter conhecido alguém que tenha utilizado esse método desde o início, para induzir esse treinamento, antes que seus filhos tenham apresentado sono irregular (insônia), nem mesmo os que já tenham usado em um filho mais velho, mesmo com sucesso.
Os hormônios da maternagem, e nos dias de hoje, na minha experiência, porque não da paternagem também, dificultam muito a utilização dessa prática desde o começo.
Assim, o sono do bebê deve ser abordado com o pediatra desde o início, para que com o decorrer das consultas se permita observar atentamente e precocemente os possíveis problemas, para tentarmos evitar que se atinja o desespero, traduzido pela frase: “Será que ele vai dormir a noite toda algum dia” ou, mais triste, por mostrar a desesperança e até um certo afastamento da criança, “Será que eu vou conseguir voltar a dormir a noite toda algum dia?”.
Qualquer alteração das funções fisiológicas de nossos filhos nos tira do sério, nos enche de preocupações, coloca em cheque nossa capacidade de sermos bons pais (ou até os melhores, na continuação da exigência de performance). Isso vale para o sono, mas também quando nosso filho não come, ou ainda não controla as fezes e a urina, ou não tem boas (ou as melhores) notas.
O método Nana, nenê não leva em conta uma das orientações atuais da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP): Aleitamento materno na primeira hora de vida, exclusivo e em livre-demanda até o 6º mês, estendido até 2 anos ou mais.
Pais não são médicos (mesmo os médicos não conseguem ser apenas profissionais em relação a seus filhos). Assim, eles podem ter dificuldades em entender se aquele choro da noite pode ser indício de algum tipo de problema de saúde, especialmente se pretendem seguir essa linha de forma mais rígida.
Até os 3 meses de vida, os bebês não têm seus “gatilhos de sono hormonais” (glândula pineal, melatonina) maduros ou em funcionamento pleno. Assim, se o bebê “seguir esse método” antes dos 3 meses certamente não foi pelo treinamento e sim porque esse seria o ritmo dele mesmo. Então até os 3 meses eu não indicaria a ninguém pela alta taxa de possível insucesso por conta da imaturidade do bebê até essa fase.
Tenho plena consciência que todos buscam o que consideram melhor para seus filhos. Assim como tenho plena certeza de que existe uma diversidade grande de culturas, filosofias, credos e que cada um considera o seu caminho como o mais adequado.
Assim, dentro do espirito de respeito às diversidades, sem agressões, sem preconceitos, tentando manter com os outros leitores e participantes e comigo também (por que não? rsrsrs) uma irrestrita empatia…
Empatia(dicionário Aulete) – 1. Psi. Experiência pela qual uma pessoa se identifica com outra, tendendo a compreender o que ela pensa e a sentir o que ela sente, ainda que nenhum dos dois o expressem de modo explícito ou objetivo. |
… pensem (e escrevam aqui para colaborar com as outras mães):
– Você acha que conseguiria usar esse método?
– O que você considera difícil, impossível, viável nesse método?
– Você já tentou ou usou o Nana, Nenê?
– Quais foram seus resultados?
Na próxima semana, vamos abordar outra possibilidade de combater a “insônia” de nossas crianças. Lembro novamente a solicitação do respeito às diversidades e ao difícil exercício da empatia. Se hoje você for pedra, na semana que vem você poderá ser a vidraça.
Quero terminar esse texto de hoje com uma frase atribuída a Mário Quintana:
”A arte de viver é simplesmente a arte de conviver … simplesmente, disse eu? Mas como é difícil!”
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